Janelas com cortinas
de rendas de outros tempos.
Portas com aldrabas
de ferro fundido negro.
Paredes de tantos segredos
como tijolos.
Ruas com pedras polidas
de tantos passos.
Arcadas mães de redondos
beijos opacos.
Candeeiros baços ornamentados
com desenhos passados.
Varandas pejadas de flores
em vasos em canteiros rasinhos.
A drogaria da esquina apertada
entre edifícios a tombar.
O sapateiro com a montra
abundante de sapatos sem par.
O fontanário seco agora,
só detendo a memória
dos cântaros cheios.
A campainha nervosa
do eléctrico amarelo.
O eco das peixeiras ampliado
pelas canastras reluzentes.
As noites de fado
dos marialvas e das cantadeiras.
As dores das viúvas
de xailes negros.
As esquinas escuras
das prostitutas tristes.
Os combates e as rixas de morte
entre os malditos.
Passeios estreitos
com pedrinhas em desenhos idos.
As fachadas
de azulejo azul e branco.
Os números das portas
em placas de chapa preta.
Bairros desta Lisboa.
Afago de poetas.
Moradas de tantos.
Jardins com bancos
de um tempo indeferido.
Ruas, vielas e cantinhos
destas pessoas
do tempo da outra senhora.
São os nossos tesouros.