Translate

13/12/2014

De um só corpo

Observo a janela plantada de gotas de chuva.
Gordas e escorridas.
Passeiam-se pelos vidros como heras de lágrimas 
num rosto em sinal de parco alívio.
Capto as imagens por detrás delas.
O cenários distorcidos, sem linhas rectas, 
com as figuras humanas profanadas,
faces indefinidas, mareadas, anuladas.

Suspenso nestas miradas eu me deixei aportar.
Apago-me, 
anulo os toques e a capacidade de ser tocado.
Sobro-me.
Fico com os pés assentes em chão real, frio.
Noto, valido que ao fundo da minha cama, 
só se contam um par de pés.
Que a minha almofada é a única neste espaço.
Reconheço os livros que foram lidos a dois e os que só eu li.
Sem me condenar à critica, 
afirmo que o estar aqui é mais do que 
só estar sozinho.
É uma presença com valor de muito mais que um mero ato.

Vejo as janelas molhadas, 
semeadas de gotículas, espuma de águas,
sem que agora esteja a chover.
São as lágrimas que sem pedir licença ou vazão,
forram-me os olhos,
enxaguam-me as mãos.